Por Miguel Nunes Silva

No Jornal Inconveniente

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No passado dia 9 de Fevereiro, Nuno Melo discursou no Instituto Democracia e Liberdade/IDL – Instituto Amaro da Costa, sobre o futuro do partido democrata-cristão. Como centro de estudos, o IDL está de momento sob a liderança de Diogo Feyo e é certamente uma instituição que centrará a atenção dos cristãos-democratas. Com as derrotas de Assunção Cristas e de Francisco Rodrigues dos Santos, o partido entrou num período de choque e desilusão. Os conflitos e as deserções são um sintoma de um problema de fundo que levou à extinção do seu grupo parlamentar e se, até agora, o IDL servia um papel cerimonial, com a reclassificação do CDS como um pequeno partido sem assento parlamentar, a introspeção filosófica e programática afirma-se como mais urgente do que nunca.

Por conseguinte, aquilo que o líder do partido tem a dizer na sede do seu centro de estudos deve ser ouvido com especial atenção, sobretudo na esteira de sondagens devastadoras para a formação política. Enquanto dirigente do Instituto Trezeno de estudos conservadores, estar presente era imperativo.

Os primeiros sinais são encorajadores.

Nuno Melo fala de um ‘momento refundacional’ do partido, discernindo que a sua liderança tem um potencial de importância vital para o partido, semelhante à de Manuel Monteiro ou Paulo Portas.

Monteiro, ele próprio, foi apresentado como a nova aquisição do IDL para o exercício de introspeção assumido pela liderança do CDS. Corroborando o novo esforço, António Lobo Xavier foi ainda anunciado como o incumbido pela formulação do novo programa do CDS; programa esse cuja elaboração se encontrará aberta a todas os contributos por mais heterodoxos, segundo Melo.

O eurodeputado reafirmou alguns dos princípios orientadores do CDS, mencionando o seu papel como fiel entre o mercado e as preocupações sociais, não descorando o reconhecimento da realidade de que os eleitores sentiram dificuldades em diferenciar o CDS e que doravante o CDS terá que ser “mais nítido”. Segundo Nuno Melo, “alguma coisa tem que mudar”.

O líder do CDS reiterou ainda a ênfase do partido no combate ao facilitismo na Educação, na oposição à menorização da agricultura pelo PS e na luta ao flagelo das drogas nos centros urbanos.

Contudo, nem tudo são rosas para os centristas e há problemas de fundo que certamente levarão a um esforço inglório, se não forem confrontados.

O principal dilema, que deveria ser afixado na porta do Caldas em letras gigantes em néon, chama-se ‘CHEGA!’. Se algo ficou claro no discurso de Melo, tal como nos participantes do evento, é que o CDS ainda não digeriu o fenómeno do novo partido de Direita em Portugal.

Começando pelo tema das sondagens, toda a Direita tem grandes desconfianças de exercícios teóricos encabeçados por empresas ultra urbanas, em parceria com grupos de comunicação social, em tudo enviesados contra a Direita. Se este fenómeno é personificado pela ala Rioísta do PSD e comum nas bases suburbanas do CH, no CDS o desprezo pelas sondagens é um exercício em esteroides.

Não obcecando, o CDS deveria ter aprendido a importância da comunicação e das previsões, em 2022, quando perdeu pela primeira vez o seu grupo parlamentar. Para piorar ainda mais o panorama, Nuno Melo classificou 2022 como um resultado “conjuntural”. Se a maior derrota da história de um partido com meio século é menosprezada e relegada a nota de rodapé, como conseguirá tal partido aprender e ‘refundar-se’?…

A alergia dos centristas às sondagens vai de mão dada ao ódio irracional sentido pelo CH. Nuno Melo falou das diferenças que o CDS mantém com a Iniciativa Liberal e com o PSD mas em relação ao partido de André Ventura, Melo afirmou perentoriamente que a democracia e a liberdade são o que separa o CDS do CH – um fenómeno político que classificou como ‘nacionalismo de esquerda’.

Esta atitude de irredutível azedume é facilmente explicada pela realidade de que o CH sonegou a maior parte do eleitorado tradicional do CDS, porém, um nível de maturidade típico do Bloco de Esquerda, não valerá de muito ao Largo do Caldas.

Impera aos centristas começar a reconhecer a realidade dos factos: o eleitorado conservador do CDS foi ignorado e assim que teve uma alternativa, abandonou o partido. Perante este desenvolvimento, o CDS resolveu coligar-se com o PSD de Rui Rio e apoiar a recandidatura de Marcelo Rebelo de Sousa, um dos presidentes da república mais populista e conivente com a extrema-esquerda, em cinco décadas. Denegrir o CHEGA! como deficiente em liberdade e democracia é factualmente contraproducente pois o partido da nova Direita foi fundado maioritariamente por ex-militantes do PSD e do CDS. Em violenta oposição às deflexões dos centristas, o CH é, na verdade, a formação política mais próxima do ideário conservador do CDS. É com o CH que o CDS deveria considerar coligações e é do PSD que o CDS mais facilmente deveria lograr distinguir-se na competição pelo eleitorado de Direita.

No entanto, a escolha de Lobo Xavier é mais um indício de que esta digestão e autoavaliação está ainda por fazer no CDS. O ex-deputado centrista fez questão de apoiar a recandidatura de Marcelo Rebelo de Sousa, que é visto pelos conservadores como o ‘presidente da bandidagem’, e ainda chegou a afirmar que conversações com o Bloco de Esquerda seriam mais razoáveis do que com o CH… Se o preconceito do PSD para com o CH é absurdo, da parte do CDS ele é simplesmente esquizofrénico.

A racionalização que os centristas fazem do CH é que se trata de um epifenómeno sensacionalista que passará com o tempo. Valerá a pena testar a teoria até o CDS sacrificar toda a sua presença política nos órgãos democráticos?

Se, nos anos 80, alguém tivesse descrito o Partido Conservador Britânico a um qualquer dirigente do CDS, a conclusão apenas poderia ser de que se tratava de um qualquer grupúsculo maoísta. A ideologia de género e o marxismo cultural, a complacência para com a imigração ilegal em massa, a atitude destrutiva para com a política energética, o universalismo legal e militar, todas as áreas de decisão dos partidos de centro direita europeus foram contaminadas por filosofias de extrema-esquerda. Perante esta realidade, o CDS ainda escolhe colaborar com o ‘centro’ e ser cúmplice dos cordões sanitários esquerdistas contra forças conservadoras na Polónia, Hungria, EUA e até em Portugal.

Parece-nos que, enquanto meros observadores externos dos dilemas do CDS, apenas mais integridade ideológica e coragem mediática poderão ajudar o CDS. A era da indulgência para com o politicamente correto acabou e o CDS não estancará a hemorragia enquanto não compreender este facto fundamental.

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